domingo, 8 de janeiro de 2012

Qual destes é o seu pai?


Lamento dizer, meu filho, mas não sou nenhum desses.
Não sou, por exemplo, o Superman. Não consigo sair por aí voando, embora muitas vezes tenha vontade de fazê-lo; tenho de me mover no atrapalhado trânsito desta cidade num modesto Gol, com esperança de não chamar a atenção dos assaltantes nem de ficar na rua com um pneu furado. Também não tenho, como o Superman, a visão de Raios-X; mal consigo ler, com muita dificuldade e incredulidade, as notícias que aparecem diariamente nos jornais e que nos falam de um mundo convulsionado e de um país perplexo. 
Não sou o Homem Invisível. Não consigo passar despercebido; tenho de ocupar meu lugar na sociedade, goste dele ou não.
Não sou o He-Man. Não tenho a Força; pelo menos não aquela Força. Tenho uma pequena força, o suficiente para garantir o pão nosso de cada dia, e mesmo alguma manteiga, o que não é pouco, neste país em que muita gente morre de fome.
Não sou o Rambo; não tenho aquela formidável musculatura, nem as armas incríveis, nem o feroz ódio contra os inimigos ( álias, quem são os inimigos? ). Não sou o Tio Patinhas, não sou um Transformer não sou o Príncipe Valente. Não sou o Rei Arthur, nem Merlin, o Mago, nem Fred Astaire. O que sou, então? 
Sou o que são todos os pais. Homens absolutamente comuns, a quem o filho transforma de repente ( porque os pais são criados pelos filhos, assim como os filhos são criados pelos pais: a criança é o pai do homem ). Homens que se angustiam com as prestações a pagar, com o preço do supermercado, com as coisas que estão sempre estragando em casa. Homens que de vez em quando jogam futebol, que ás vezes fazem churrasco, que ocasionalmente vão ao teatro ou a um concerto. Destes homens que são feitos os pais.
Quando os filhos precisam, estes homens se transformam. Se o filho está doente, se o filho tem fome, se o filho precisa de roupa estes homens adquirem a força do He-Man, a velocidade do Superman, os poderes mágicos de Merlin. Mas a verdade é que isto não dura sempre, e também nem sempre resolve. A inflação, por exemplo, nocauteia qualquer pai.
Não, filhos, não somos os seres poderosos que vocês gostariam que fossêmos. Mas somos os pais de vocês, que um dia serão pais como nós. Os heróis são eternos. Os pais não. E é nisso que está a sua força.

( Para Gostar de Ler, Vol. 18. Um País Chamado Infância. São Paulo: Ática, 199. p. 76-77 ) 

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